domingo, 24 de novembro de 2013

Mulheres ainda querem homens das cavernas


Tem mulher que ainda quer um parceiro homem das cavernas. Pelo menos é isso o que eu deduzo quando fico sabendo que alguém deu um fora em um homem porque ele sugeriu dividir a conta no encontro, e não pagá-la sozinho. Ou, ainda, que alguma mulher teve um encontro ótimo com um cara super interessante, mas que afirma que não dará certo porque ele não tem emprego fixo.
 
 

Ora, para uma mulher dessas, teria algo melhor do que retroceder ao período Neolítico? Nessa época, a divisão de trabalho era marcantemente definida por sexo. Não restavam dúvidas de que o homem era responsável pela proteção e sustento das famílias. Do ponto de vista evolutivo, seria mais vantajoso perder uma mulher do que um homem, pois sem este último o bando teria as possibilidades de provento e sobrevivência fortemente afetados. Poderia haver papel com caráter mais limitante e subordinativo a se conferir às mulheres?

Em 2013, não muita coisa mudou. Não é raro ver mulheres com cara de paisagem quando o garçom traz a conta. Alguns carnês parecem até carregar consigo doenças infecciosas, pois muitas sequer ousam tocá-los. Muitos homens compartilham da mesma linha de pensamento – acreditam que é seu dever pagar a conta, talvez como uma forma de retribuir financeiramente o tempo passado junto (embora eu tema que exista outro nome para isso – e não é bonito). Outros apenas fazem porque é isso que se ouve dizer ser a atitude corriqueira, embora nunca tenham refletido sobre isso. Tantos outros, em contrapartida, acreditam que a mulher deveria compartilhar dessa responsabilidade; quase todos desse grupo, no entanto, preferem se render e ir contra seus princípios caso sintam que isso ameace suas chances de tirar uma calcinha no fim da noite.


Pra você que está procurando um namorado “que te dê segurança”: o da direita é mais gatinho. Fica a dica.

          É tão difícil perceber que a tal “segurança financeira” que as mulheres ainda hoje esperam dos homens não difere em nada da segurança (e controle) outrora oferecida –brutamente – pelos homens que viveram em 10 milênios antes de Cristo?

            O grande conflito paradigmático da atualidade, contudo, é o seguinte: as mulheres nascidas a partir da década de 1980 não esperam mais um homem que lhes forneça tudo para que possam se dedicar exclusivamente ao lar. Ao contrário. Elas desejam ter empregos, profissões, renda própria e até carreiras. Mas ainda assim esperam que o homem seja sempre MAIS: mais estável financeiramente, mais importante, mais bem sucedido, mais poderoso, enfim. Inevitavelmente, até mesmo as relações conjugais se transformam em relações de poder.

            Se este é o paradigma – defendido pelas próprias mulheres – quem de fato está lutando pelas tão aclamadas melhores condições de trabalho para as mulheres? As reivindicações por igualdade em cargos e salários para homens e mulheres não faz sentido, partindo desse princípio. Para que remunerá-los igual, se as próprias mulheres não aceitam ter as mesmas responsabilidades? Para que poder ter as mesmas oportunidades no mercado de trabalho, se a ideia é manter os homens no poder?

Mulheres, meu recado é o seguinte: a sociedade evoluiu. Muita coisa mudou desde o período Neolítico - e deve continuar mudando. As relações sociais ficaram muito mais complexas, os recursos para se viver se tornaram muito mais acessíveis e às mulheres foi concedido o direito à vida pública, que expandiu seu papel social enormemente.

Assumam a responsabilidade e controle de suas vidas. Mudem de paradigma. Pois, da mesma forma que vocês acham “justo” trocar de parceiro por outro que ofereça mais proteção e estabilidade, igualmente “justo” seria um homem trocar sua parceira (você mesma) por uma mulher mais jovem, mais bonita e mais fértil– apenas por esse motivo. Ora, é a lei da selva. Não é essa lei que vocês tanto defendem?

domingo, 19 de maio de 2013

Agressividade Virtual

         


          Acredito que todos já presenciaram algum episódio do que chamo de “agressividade virtual”. Isto acontece quando alguém exprime alguma opinião na internet, em especial nas redes sociais, e muitos outros se unem para contrariar o que a pessoa propôs, em caráter extremado de humilhação e retaliação.

          A pessoa pode ter defendido uma opinião plausível ou realmente questionável; pode ter tecido comentários sobre algo simples ou complexo; ter se pronunciado sobre algo banal ou de cunho ideológico. Todas as situações, entretanto, compartilham de uma mesma semelhança: o que foi dito não justifica a magnitude da represália recebida.



          Tal represália caracteriza-se pela agressividade desmedida, pelo sarcasmo cruel, destrato maldoso e arrogância desnecessária. Várias pessoas – desconhecidos, inclusive - se juntam, unidos por uma agressividade primitiva, com um único objetivo: atacar, crucificar, retaliar de forma descomedida alguém que pense diferente.

          As pessoas se sentem confortáveis para degladiar outras pela simples proteção de uma tela de computador. Nem mesmo as redes sociais, onde é cada vez menos possível permanecer anônimo – as quais nos informam quantos amigos temos em comum com tal pessoa, que revelam nossos nomes e fotos, onde trabalhamos e como passamos nosso tempo livre –, são capazes de segurar a máscara que diferencia nossas atitudes dentro e fora do mundo virtual.



          O – pouco – anonimato que a internet provê é suficiente para aflorar uma agressividade incomensurável, um ódio primitivo, um desejo sangrento de promover a discórdia e a vontade de “ver o circo pegar fogo”. A questão é: as pessoas não se transformam; elas são aquilo.

          Essa condição, analogamente, se estende ao mundo “real”. As pessoas que se envolvem em tais discussões virtuais extremadas são as mesmas que mostram o dedo do meio quando recebem uma buzinada, mesmo quando estavam de fato erradas; que descem do carro prontas para brigar pois levaram uma singela “fechada” no trânsito; ou aquelas que, brutalmente enraivecidas, xingam o atendente do caixa apenas porque receberam o troco errado.

         Quando presenciamos algum destes episódios, nos inquietamos com as reações desproporcionalmente agressivas e violentas dos envolvidos, e agradecemos por não convivermos com pessoas assim em nosso meio de convívio. O intrigante, contudo, é o fato de que esses protagonistas são de fato as pessoas com quem convivemos, com quem dividimos o elevador, com quem compartilhamos a fila do supermercado, e em quem damos tapinha nas costas. É o colega de turma, o morador ao lado, o parente, o amigo. Ou, no pior dos casos, é aquele que o espelho reflete à nossa frente.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Teoria dos Legos

   

          Já falei aqui sobre o tal “cabelo de lego”, aquele corte padrão e sem graça que a sociedade impõe que os homens devem adotar. Defendi, acima de tudo, que minha total falta de atração por tal corte de cabelo não ocorre apenas em função de seu fim estético, mas sobretudo por sua simbologia.

          Muitos se surpreendem com meu posicionamento. A sociedade ainda não parece estar preparada para a teoria dos cabelos de lego. De fato, é uma teoria demasiadamente inovadora e revolucionária até para o ano de 2013. É uma teoria multifacetada que envolve muitas variáveis. Sob sua ótica, fatores aparentemente desconexos se entrelaçam harmonicamente em uma lógica iluminadora. Ela envolve a problemática de condutas sociais, poder de dominação, padrões de comportamento, paradigmas culturais e até feminismo.

O tal "cabelo de lego".

Quem é radical, afinal?



          Muitos alegam que sou radical por considerar o cabelo comprido um pré-requisito para me interessar por um homem. Na realidade, radical é a norma de que todos os homens devem ter cabelo curto. Aliás, quantas mulheres já não disseram com todas as letras que detestam homem de cabelo comprido e, portanto, só ficam com homem de cabelo curto? E por que isso não é radical? Ora, porque esse é o paradigma vigente para a sociedade atual, essa é a convenção social em vigor. Isto é, qualquer que fosse o padrão, X ou Y, poderia ser veementemente reforçado ou rechaçado. E o que define se será reforçado ou rechaçado são as instituições no poder em dado momento histórico/político/econômico. A essência deste sistema é o poder de fazer qualquer coisa - o que convier no momento - ser defendida por toda uma sociedade como certo ou errado.

          Este é o sistema de domínio que define o que as pessoas vão achar bonito ou feio, divertido ou chato, correto ou injusto, ou o que vão apreciar ou depreciar em termos de música. É o sistema que padroniza a sociedade. Estas forças exercem um domínio tão pleno, que se dá de forma tão inconsciente, que as pessoas encaram muitos de seus padrões de comportamento como "naturais". Os homens nem questionam por que têm cabelo de lego. Eles simplesmente têm. Eles simplesmente nem cogitam outras opções. Eles foram hipnotizados pelo axioma segundo o qual "homens têm cabelo curto e mulheres têm cabelo comprido". As mulheres, em contrapartida, sequer refletem por que gostam – ou acreditam que gostam – apenas de homens com cabelo curto. Elas simplesmente gostam e sequer refletem que poderia ser diferente, que isso poderia ser questionável.

          O perigo desse domínio encontra-se justamente quando pensamos em todos os outros valores e formas de conduta que apenas repetimos, sem questionar. Fenômenos mais complexos do que um simples corte de cabelo (não que um corte de cabelo já não carregasse consigo valores, signos e representações complexos o suficiente!) a que estamos sujeitos a defender ou rechaçar com todas as nossas forças, acreditando, quase que num estado hipnótico, que tal posicionamento é genuinamente nosso.



“O que meus clientes vão pensar?”

          Ainda é evidente o preconceito em relação a homens de cabelo comprido em empresas privadas e corporações de todo tipo. Via de regra, é este o motivo que faz tantos homens se renderem ao cabelo de lego.

          Os empresários defendem que o cabelo comprido em um homem é motivo lícito para demitir ou não contratar, e justificam seu preconceito a partir da máxima "o que meus clientes vão pensar?". Esse pensamento é raso e arbitrário por dois motivos.

          Em primeiro lugar, todos somos clientes. Como massa consumidora, toda a sociedade é cliente de alguém. Logo, tal cliente sou eu, é você, é a própria pessoa que articulou tal frase. O empresário que a proferiu compartilha deste preconceito. Um preconceito que é covardemente transferido para outros: os clientes, a sociedade, a massa consumidora – a qual ele mesmo compõe.

          Em segundo lugar, o que o resto da sociedade – os tais “clientes” – tanto tem que exige tanto que estejamos à sua altura? O que seus clientes irão pensar de um funcionário de cabelo comprido, não é mesmo, caro empregador? Seus clientes, aqueles indivíduos ilustres que cheiram cocaína antes de colocar o terno e a gravata, que dirigem embriagados, que jogam lixo no chão, que não se levantam do assento prioritário quando um idoso entra no ônibus, que condenam a corrupção na política mas oferecem propina ao policial para se livrar da multa, que ultrapassam pelo acostamento, que não cumprimentam o porteiro, que estacionam em vagas de deficientes porque “serão só 10 minutinhos”.

          O funcionário adequado para sua empresa deve ser, acima de tudo, um homem de cabelo curto, certo, empregador? Porque, claro, o que mais poderia definir caráter e competência profissional a não ser centímetros de fibra capilar? O trabalhador que você procura deve estar alinhado à representação de sucesso dessa sociedade doente que você ajuda a manter: o cara que troca de carro todo ano, mas não tem dinheiro para pagar o IPVA; que ocupa uma posição de prestígio e poder e assedia sua secretária; que estudou nas melhores escolas, já realizou intercâmbios culturais em diversos países e cujo programa preferido é o Big Brother Brasil. São essas pessoas, exemplo de sucesso, que sua empresa precisa. Todos sempre com o cabelo devidamente podado e alinhado, porque é isso que faz a diferença, obviamente.


O cabelo comprido como crítica social

          De fato, o cabelo comprido em um homem representa um ato transgressor, uma crítica social. Daí seu perigo, aos olhos daqueles que visam manter o sistema. As instituições sociais – principalmente empresas e escolas – não desejam pessoas questionadoras e críticas; desejam marionetes, pessoas que apenas respeitam o sistema, seguem o que é ditado e reproduzem o que já existe. Anseiam pela manutenção do status quo, enfim. Uma das muitas formas de manter tal domínio é padronizando os homens fisicamente.



          Além de mascarar individualidades e esmagar autenticidades, o cabelo de lego reforça velhos padrões de gênero.

          Uma das várias facetas da teoria do cabelo de lego é a problemática de gênero. O cabelo curto é um dos tantos estereótipos masculinos sem sentido. É um padrão de masculinidade inconsistente e ultrapassado, como tantos outros.

          De igual importância, temos a questão da estética propriamente dita. Da mesma forma que as mulheres ficam melhor ou pior de acordo com o corte de cabelo, os homens também. É por isso que mulheres com rostos mais circulares evitam cabelo curto; que mulheres com cabelos finos e demasiadamente lisos optam por repicá-los; que mulheres com cabelos muito ondulados evitam franjas.

          Aos homens, ao contrário, é concedido o direito de não precisarem ser fisicamente atraentes. Pelo menos essa não é, nem de longe, a prioridade. Quantos não dizem que mantêm o cabelo curto porque seu cabelo é "ruim" ou "difícil"? Ora, quantas mulheres também não têm cabelos difíceis, muito volumosos, ou muito murchos; muito ondulados ou muito lisos; muito secos ou muito oleosos? Não é justamente por isso que elas diversificam os cortes, fazem alisamentos, escovas progressivas, permanentes, tinturas, hidratações, etc? E se elas também fizessem como os homens: raspar, ou deixar bem curto, porque é mais fácil?

          Isso está fora de cogitação. Nossas formas de conduta estão assentadas sob o princípio de que as mulheres precisam estar constantemente tomando ações que as tornem sexualmente atraentes. Dos homens, em contrapartida, é exigido apenas um básico ritual de higiene: basta tomar banho, aparar a barba e passar desodorante. E por quê? Porque o desejo da mulher raramente está em questão. "Elas que fiquem com as migalhas", diz a sociedade, nas entrelinhas. Ainda mais triste é o fato de a maioria das mulheres estar tão dominada por essa forma limitada de pensar que sequer percebe que estão se contentando com migalhas.



          É claro que não defendo que todos os homens passem a ter cabelo comprido; isso seria criar um padrão do mesmo tipo. Tampouco defendo que os homens passem a ser tão obcecados por seus cabelos como as mulheres, mas sim que as exigências estéticas sejam menos desiguais. O que sugiro, sobretudo, é que a sociedade reflita sobre as bases que fundamentam seus valores e seus padrões de comportamento.

          Alguns homens realmente ficam melhores com cabelo curto; outros, ao contrário, não seriam tão atraentes se cortasssem suas madeixas. Muitos homens combinam com seus cachos, e por isso deveriam deixá-los crescer; tantos outros se iluminam pelo rosto moldado com as mechas lisas. É esta a diversidade que se faz necessária. Impor um mesmo corte de cabelo a todos os homens, mesmo que não valorize a maioria deles, é um mecanismo de padronização tão alienante que beira a insanidade coletiva.



          Hoje encaramos como absurda a realidade de poucas décadas atrás segundo a qual as mulheres não podiam escolher seus maridos - tampouco podiam escolher não casar. Isto é, elas deveriam se casar com o homem - extremamente nojento, geralmente - que tivesse sido definido por outras pessoas – o pai ou o próprio futuro marido - independente de amá-lo ou sentir atração física por ele.

      De forma análoga, algum dia a sociedade ainda vai se despertar para o absurdo, considerado normal hoje, que é o fato de as mulheres serem impelidas a estarem sempre impecavelmente belas e sensuais, ao passo que devem se contentar com homens pouco vaidosos e pouco atraentes. Algo que poderia mudar – e muito – simplesmente pela iniciativa de alguns homens de diversificarem os cortes de cabelo. Se isto ocorresse, as mulheres não mais ficariam encurraladas por terem que escolher dentre as limitadas opções de homens que compartilham do mesmo corte de cabelo ridículo. Um corte que não pretende deixá-los mais bonitos e atraentes, mas apenas práticos. Um corte cujo único objetivo é facilitar a vida. Dos homens.