segunda-feira, 2 de abril de 2012

Não sou contra a vaidade





Muitos leitores, assim como Amanda, devem acreditar que sou contra a vaidade. Devem crer que eu considere futilidade se arrumar, se maquiar, ir ao shopping, etc. Alguns devem até deduzir que eu acredite que as mulheres devam ser feias para serem revolucionárias. Essa interpretação equivocada de meu pensamento me preocupa muito, pois passa longe da veracidade.

Eu não sou contra a vaidade. Não a vaidade propriamente dita. Eu mesma sempre faço escova no cabelo, por exemplo. Adoro cabelo ondulado e cacheado, mas o meu, naturalmente, é daquele estilo ondulado indefinido, que parece descabelado não importa quantas mil vezes penteei. Soma-se a isso o fato de que tenho 3 vezes a quantidade de cabelo que uma pessoa normal tem (é sério).

Adoro comprar roupa nova (mas confesso que ultimamente só compro em promoção) e já fiz várias sessões de depilação a laser. Adoro pintar as unhas, principalmente de cores fortes como vermelho, vinho e marrom. Amo brincos, principalmente os enormes, e não cogito ficar sem eles.

Maquiagem admito que não uso no dia-a-dia pelo simples fato de não achar necessário. Uso apenas em ocasiões especiais, mas mesmo assim de um modo muito leve. Digamos que batom não combina muito comigo, eu simplesmente fico parecendo um periquito comendo uma cereja. Bizarro mesmo.

Mas não acho que quem se maquia é fútil. Um delineador de olhos e um brilho labial não fazem mal à ninguém; pelo contrário. O que eu acho fútil é aquela necessidade de estar sempre com aquela maquiagem extremamente carregada, estilo Emília do Sítio do Pica-Pau Amarelo, para todas as situações, inclusive as mais insignificantes. O que eu acho fútil é aquela obsessão por estar sempre impecavelmente arrumada 24 horas por dia. Além de futilidade, isto denuncia um problema maior: o machismo invisível, segundo o qual as mulheres devem sempre ser julgadas por suas características físicas.


A vaidade não é um problema...até que se torne uma questão de gênero.

Isso não tem a mínima graça.

 
Não é novidade para ninguém que, enquanto as mulheres estão neuroticamente preocupadas com sua aparência, os homens só tomam banho, passam desodorante e vestem aquela camisetinha branca básica. Isso pouco importa para a vida social ou profissional deles. Eles simplesmente não precisam ser aprovados pela aparência para conquistarem respeito ou o que quer que seja. Tem algo injusto aí, não?

Outra questão relevante é que a esmagadora maioria da população mundial não esbanja quantias inesgotáveis de dinheiro. Muito menos as mulheres, que ainda ganham menos que os homens. Sendo assim, você não consegue comprar tudo o que deseja e ainda pagar todas as contas do mês; é preciso estabelecer prioridades.

E o que isso significa? Bem, é fácil: se a prioridade de muitas mulheres é freqüentar o salão de beleza todo mês, fazer drenagem linfática habitualmente, pagar a “lipinho básica” no fim do ano e comprar bolsas que custam mais que um salário mínimo, quem acaba pagando a escola das crianças, a conta de luz, o IPVA, a comida para pôr na mesa? Exatamente, o homem. E, se desejamos igualdade, ela começa pelos deveres iguais, inclusive os financeiros.

Acho que sei pra quem vão sobrar essas contas...


Quando a vaidade deixa de ser saudável.

Cansei de ver meninas e mulheres chegando à faculdade à noite, após um longo dia de trabalho e minutos antes de começar a aula, obstinadas a retocar a maquiagem (com instrumentos tão diversos que alguns deles sequer sei o nome). Ora, pra quê? É só uma aula, você está aqui para estudar! Algumas estão tão maquiadas logo cedo (e para os compromissos mais desnecessários) que só podem ter acordado 5 horas da manhã para isso. Algumas são tão neuroticamente retocadas com pó que dão até vontade de espirrar.

Sempre vejo mulheres que mal conseguem andar devido ao salto altíssimo. No fim do dia, estão fisicamente esgotadas e seus pés moídos não lhes permitem fazer mais nada. Não é à toa que são presa fácil de assaltantes: elas não vão conseguir fugir!

Sapato com salto é mais bonito? Pode até ser, mas o primordial não deveria ser o conforto? Vejam, não precisamos viver de “rasteirinha” para estarmos confortáveis. É possível sim usar sapatos com saltos, mas daquele tipo que ainda te permite realizar funções básicas como andar e sair para almoçar.

Todo dia vejo mulheres se privando de certos alimentos, reclamando que “esse engorda”, “isso dá barriga”. Não se entregam a uma pizza deliciosa ou a um cachorro-quente suculento. Se o fazem, é com culpa. Elas contam calorias até de um copo de suco.
 



Ora, isso não é vaidade. Isso é escravidão à estética; é incorporar o conceito de que mulher só tem valor se for para enfeitar o ambiente sexualmente; é reforçar o conceito de que nosso único poder é pela beleza; é fortalecer o valor de que precisamos ser julgadas pela aparência, antes de tudo.

Beleza e revolucionarismo não são antônimos.

Isso não significa que devemos ser feias para sermos revolucionárias. O que tento mudar é justamente o conceito de mulher feia: arrumo meu cabelo, uso roupas novas, pinto as unhas, combino as cores do sapato, mas não preciso passar batom, pó, delineador, blush, pôr cílios postiços, gastar minhas economias em cirurgias plásticas e usar diariamente salto de 10 cm para poder ir até a esquina.


Hoje em dia, muitas mulheres não sabem a diferença entre ser vaidosa e ser fútil. Creem que só existem dois extremos: ser vaidosa e fútil ou não-vaidosa e “baranga”. O que se tem em mente é que, para ser bonita, é necessário cair na futilidade, o que é um grande equívoco. É muito possível que os dois conceitos não caminhem juntos, o que significa que podemos ser vaidosas sem sermos fúteis e, melhor ainda, podermos ser bonitas e ainda sermos revolucionárias.

Se arrumar e se maquiar é legal? É. O que não é legal é tratar isso como se fosse o maior valor de uma mulher, o primordial em nossa existência, um passaporte necessário para ser respeitada, um pré-requisito para poder aceitar a si mesma. O espelho não pode se tornar a nova submissão da mulher.