sábado, 26 de maio de 2012

Saúde da vaidade

É incrível como as pessoas empreendem esforços homéricos para se adequarem ao padrão de beleza vigente. Passam fome propositalmente; trocam uma lasanha deliciosa por uma porção sem graça de alface; perdem o momento de ajudar os filhos na lição de casa, mas não perdem a sessão de spinning; dizem que adorariam aprender a tocar um instrumento musical e não o fazem porque não tem dinheiro, mas pagam satisfatoriamente a mensalidade da academia.
Mas o mais surpreendente é como elas justificam tudo isso: “é pela saúde”. Ok, fazer exercícios é recomendação médica. Evitar determinados alimentos previne certas doenças. Levar uma vida saudável é requisito para a longevidade. Mas as pessoas que dizem isso são as mesmas que se orgulham do quanto beberam nas festinhas com os amigos, que fumam, que bebem muito mais Coca-Cola do que água, que usam drogas para “se soltarem mais” nas noitadas, que misturam energéticos a bebidas alcoólicas, que já deformaram os ossos dos pés por usarem salto alto indiscriminadamente, que prejudicam a pele a expondo ao sol exageradamente e sem cuidado algum, que consomem suplementos alimentares potencialmente cancerígenos para evidenciar a musculatura, que ingerem remédios emagrecedores com fórmulas mirabolantes e cheios de efeitos colaterais, que fazem sexo sem preservativo.

Isso realmente tem cara de ser muito saudável.

Os remédios emagrecedores te deixam magra, mas sem saúde nenhuma por dentro.

Montagem esteticamente exagerada, mas de fundo verdadeiro: salto alto em excesso retrai a musculatura da panturrilha, atrofia o tendão de Aquiles e pode até modificar a estrutura da coluna.

Não sei se a imagem é real, mas deu pra entender a idéia.


Ora, vocês não acham que a busca por uma vida saudável deveria envolver muito mais do que técnicas para emagrecer ou métodos para enrijecer os glúteos e secar a barriga? Tem algo incoerente aí, não? E quem disse que ser gordo é sinônimo de falta de saúde? Muitos gordos têm mais saúde do que muitas pessoas magras. Muitos gordos têm melhor índice de colesterol do que muitos homens que estão na faixa ideal de peso. Muitas mulheres magras têm anemia (pesquisas indicam que mais de 30% das brasileiras sofrem de insuficiência em ferro), problema de saúde este, dentre muitos outros, que muitas mulheres acima do peso não têm.
É evidente que não estou generalizando. Não são todas as pessoas que fazem academia ou regime que o fazem apenas por estética. Problemas de pressão alta, diabetes e obesidade são apenas alguns exemplos de como estas medidas são, por vezes, realmente necessárias. Mas é inegável que grande parte dos adeptos tem outro objetivo.
Como já disse em outro texto, não sou contra a vaidade. Não a vaidade em si, mas sim a supervalorização do corpo em detrimento de outras coisas, em especial em relação à mulher, pois é inegável a problemática de que, julga-se, nosso único poder é pela beleza e que devemos nos afirmar socialmente por este meio.
Todavia, se você quer levar uma vida focada no corpo, é um direito seu. É você quem decide. Quem sou eu para impedir? Mas seja coerente. Admita que quase tudo o que faz é puramente por estética, para se sentir adequado, para seguir a uma ditadura de beleza e para corresponder ao que a mídia e a sociedade em geral espera de você. Confesse que a saúde pouca importa. Ou então, quando alguém te perguntar porque você evita um pedaço maravilhoso de pizza "porque faz mal", mas toma shakes emagrecedores suspeitos; porque não toma refrigerante devido ao açúcar excessivo e prejudicial, mas consome anabolizantes e derivados; porque enche o corpo de substâncias ilícitas nas noitadas, mas evita uma irresistível porção de batata frita porque “fritura é nociva”, responda: “ é tudo pela saúde. Saúde da vaidade”. Será mais sincero.