sexta-feira, 8 de outubro de 2010

03/10/2010: Dia de se vestir de palhaço


Diante da enorme palhaçada que se tornaram as eleições de 2010, pensei que nada seria mais digno do que ir votar com nariz de palhaço. Se o eleitor é feito de palhaço, chega a ser uma questão de honra ir vestido à caráter.


As pessoas reagiram de formas diversas: muitos elogiaram a atitude, fizeram gestos de aprovação e comentários acolhedores. Alguns até pediram um nariz de palhaço (como eu tinha no bolso mais alguns, dei). Muitos apenas olhavam com um sorriso afável, expressando claramente no olhar que pensavam consigo mesmos que era assim que gostariam de ter saído de casa, mas lhes faltava coragem. Outros tantos olhavam e fingiam que nada estava acontecendo (e não é difícil deduzir que é também dessa forma que eles reagem a qualquer outra coisa).


É claro que sempre tivemos motivo de sobra para nos sentirmos palhaços em todas as demais eleições que já se passaram, já que a falta de ética e seriedade política são problemas que afligem o país por toda sua história, a começar pela época da colonização. Mas esta eleição, que deu voz à Tiririca (e agora não apenas voz, mas o cargo de Deputado Federal), Mulheres-Fruta e demais apelações estúpidas ao ridículo, foi demais. De qualquer forma, para mim já é absurdo o próprio fato de existirem “mulheres-fruta” (ícones do machismo tal como ele se expressa atualmente) ou um Tiririca (ícone da música brega-alienante fortemente amparada pela grande mídia).


Os que votaram no Tiririca certamente o fizeram por protesto. Mas são tão imbecis que não percebem que esse é um tipo de protesto que piora as coisas ainda mais. É claro que não defendo que devemos votar nos playboys de “família com carreira política” (para muitos, esse fator é um motivador de voto, por incrível que pareça). Mas não existem apenas os 2 extremos “Tiririca X Fernando filhodaputa Carli Filho”. Existem muitos candidatos bons que querem fazer mudanças positivas e que encaram a candidatura com seriedade. São poucos, certamente, e justo estes não fazem campanhas milionárias que os evidenciam, mas é só saber procurar. É ir atrás das propostas, é debater com conhecidos. Certamente haverá um candidato com cujas propostas nos identificaremos.


Sou totalmente a favor de protestos. Mas sou contra protestos imbecis, que não levam a lugar nenhum e, pior, conseguem piorar a situação. Muitos poderão alegarão que ir votar com nariz de palhaço é um protesto imbecil que não leva a lugar nenhum. Leva, sim. Leva as pessoas a verem que não podemos ficar reclamando apenas com nossos vizinhos. Leva as pessoas a verem que devemos dar nossa opinião sem medo e sem vergonha. Leva as pessoas a verem que, para conquistar qualquer coisa para a coletividade, devemos deixar de lado nossas ansiedades e medos individuais. Para conquistar algo pela coletividade, devemos pensar como coletividade, mesmo que isso signifique “pagar mico”, “ser abordado pela polícia” ou qualquer outra coisa que aflija apenas o “eu”.


Mas em tempos de extrema individualidade, isso soa como utopia. Em tempos de egocentrismo doentio, de supremacia da vaidade, de egoísmo exacerbado, de preocupação com “o que é divertido para mim”, independente do fato de que essa diversão por vezes seja um arsenal de valores e hábitos prejudiciais à sociedade, dentre outras coisas, propor que as pessoas levantem a bunda da cadeira para tomar uma atitude em relação a algo que vai além de seus próprios umbigos, soa como piada.


Muitos se alegram com o fato de que vivemos uma democracia e que o povo tem o direito de votar em quem quiser, entusiasmando-se por essa ser, supostamente, uma situação melhor do que a de muitas outras nações. Mas pouco adianta gozar de democracia se a população não sabe escolher, não sabe protestar. E se não sabem escolher ou protestar, muito é porque não foram ensinados a isso. Pelo contrário. Somos ensinados a aceitar tudo, a agir passivamente, a sermos padronizados para nos adequarmos ao que esperam de nós, a acreditar que “nada podemos fazer”.


Tiririca alega que “pior que está, não fica”. Como boa pessimista – e realista - que sou, garanto que fica pior, sim. E já ficou.